sábado, 6 de agosto de 2011

O novo-velho Yes



Depois de 10 anos, o Yes lançou um disco novo de inéditas, Fly From Here. Os últimos discos já andavam bem fracos, então eu não esperava muito. Porém, graças a duas excelentes decisões, o disco me surpreendeu totalmente: aproveitando que Jon Anderson não está mais na banda (de novo), trouxeram de volta à banda o tecladista Geoff Downes e conseguiram que Trevor Horn produzisse e compusesse para o álbum. Em outras palavras: sim, a formação do álbum Drama de 1980 estava junta no estúdio de novo, e sim, o disco é praticamente um "Drama II".

Em primeiro lugar, preciso dizer que uma afirmação dessas vindo de mim não é pouca coisa. O Drama é o meu disco preferido do Yes. Mais do que isso: eu tenho o vinil dele ele emoldurado na parede da sala da minha casa.

Yes, 1980: Howe, Downes, White, Squire, Horn

Isso não quer dizer, entretanto, que esse disco é tão bom quanto o Drama, claro. Fly From Here não tem a energia que o Drama tem. Soa como um disco um pouco mais "cansado". Os tempos das músicas são realmente mais lentos, mas talvez eu esteja também projetando a minha percepção sobre a idade dos integrantes da banda: tirando o vocalista, todos estão por volta dos 60 anos, enrugados e de cabelo branco — ao contrário do Paul McCartney, que parece ter parado no tempo, o Yes parece uma banda de "vovôs" no palco.

Yes, 2011: White, Howe, Horn (agora produtor), Squire, Downes, David

De qualquer forma, sem dúvida os álbuns têm o mesmo DNA. Para quem achava que nunca mais ouviria música nova com aquela determinada textura, ouvir música que tem visivelmente a mão de White, Howe, Squire, Downes e Horn é fantástico. É um pouco como quando Brian Wilson concluiu Smile 37 anos depois: é claro que não é o mesmo disco que ele teria feito se tivesse conseguido terminá-lo com os Beach Boys nos anos 60, mas o feeling que um determinado time de produtor(es), compositor(es) e intérprete(s) são capazes de imprimir em um álbum é algo único.

O vocalista, Benoit David, é um coadjuvante no álbum que não compromete. Quando Jon Anderson teve problemas de saúde, os demais membros do Yes, depois de uma espera que parecia sem fim, decidiram continuar sem ele. Seguindo o exemplo do Journey, a banda contratou o vocalista de uma banda cover de Yes. Nessa época, vi uns vídeos e ao notar que o vocalista meramente imitava o Jon Anderson, perdi totalmente meu interesse pela banda, que havia recrutado também o filho de Rick Wakeman para os teclados e saía em tour sem material novo, quase como uma banda cover de si mesma. Chegaram a tocar no Brasil, mas apesar de sonhar ver a banda ao vivo há muitos e muitos anos, para aquele Yes eu não viajaria pra ver. Agora, com Geoff Downes nos teclados e sob a batuta de Trevor Horn na produção (que foi o vocalista do Drama e produziu o 90125, o disco de maior sucesso do Yes), Benoit David parece não estar imitando Anderson — na verdade, ele parece estar mais imitando Horn do que qualquer coisa. O que é até natural, na verdade, dado que os vocalistas frequentemente copiam o estilo de cantar do compositor (comparem a demo de "Space-Dye Vest" com Kevin Moore no vocal e a versão final, ou reparem como Gene Simmons canta "Cold Gin" com um ar desleixado de Ace Frehley).

Vários fatores contribuíram para essa "volta ao Drama". A saída de Jon Anderson foi a primeira. Com ele fora, o Yes pôde voltar a tocar músicas do Drama ao vivo. Por ser o único disco gravado sem ele, Anderson se recusava a cantar músicas dessa fase, e por esse mesmo motivo havia enorme expectativa quanto a ouvir esse disco, que sempre teve um status meio cult dentro do catálogo do Yes. Além de ser um excelente disco, o Drama traz pitadas de elementos estranhos ao resto da obra do Yes, trazidos pela injeção de modernidade (para os padrões de 1980) que Horn e Downes trouxeram para a banda quando da primeira saída de Jon Anderson e Rick Wakeman. Curiosamente, nas comunidades online, os fãs de Yes se categorizam como "travelers" (preferem os primeiros discos), "troopers" (preferem a fase clássica), "generators" (preferem a fase anos 80)... ou "panthers" (preferem o Drama!). Isso já demonstra o status especial do disco no cânone do Yes. A excelente recepção que as músicas do Drama tiveram ao vivo na tour de 2009/2010 com certeza plantaram na cabeça de Chris Squire a semente da ideia de chamar Trevor Horn para a produção do próximo álbum.

Horn, depois do fiasco como vocalista do Yes (ele não tinha alcance vocal para cantar o repertório de Anderson e era frequentemente vaiado nos shows) assumiu a carreira de produtor e foi muito bem sucedido. Inicialmente com o próprio Yes, produzindo o hit "Owner of a Lonely Heart" e depois se tornando um nome extremamente requisitado do mundo pop-rock.

Durante o hiato do Yes, houve ainda a reunião do guitarrista Steve Howe com Geoff Downes na volta da formação original do Asia, supergrupo pop-rock que eles tiveram juntos com o Palmer (do Emerson & Lake) após a dissolução do Yes causada pela turnê do Drama. A resolução das diferenças entre Howe e Downes e a boa recepção dessa volta entre os nostálgicos fãs sem dúvida contribuiu para essa volta.

Inicialmente, a banda chamou Horn para produzir uma música de sua autoria que tinha ficado na gaveta em 1980. Por sugestão de Horn, trouxeram de volta Geoff Downes à banda, dispensando Oliver Wakeman... mas como no Yes é um entra-e-sai de integrantes, já o fizeram dizendo "quem sabe um dia ele volta".

Felizmente, o resultado final não ficou algo explicitamente saudosista, projetado para parecer algo feito em 1980. O disco não é uma caricatura, como é o Sonic Boom do Kiss, que tenta parecer um disco feito nos anos 70. Por outro lado, é um disco claramente alheio às tendências musicais. É um disco feito pros fãs do Yes, e em especial, para agradar aos "panthers". Este aqui, pelo menos, ficou bastante satisfeito. Se os rumores de uma volta à América do Sul no final desse ano forem confirmados, estarei lá!

5 comentários:

  1. Gostei muito do texto. Foi bastante educativo pra pessoas não tão mergulhadas no mundo do rock :-)

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  2. Valeu! Eu comecei escrevendo o texto como se comentasse pra quem já conhecia a história, mas depois resolvi aumentar e ajustar ele pra tentar ser mais explicativo. Que bom que consegui! :) Tive que me segurar pra não sair contando a história inteira da banda!

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  3. Preciso escutar esse e incluir na coleção! Tb sou bastante fã do drama (apresentado pelo Hisham, diga-se de passagem).

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  4. Excelente a resenha do Álbum. Curioso é que o Drama foi muito criticado na época de seu lançamento e hoje concluímos que ele envelheceu muito bem e com dignidade. Passado mais de um ano do lançamento do excelente Fly from Here, esperamos ansiosamente por um novo álbum dessa banda que fez mais do que história na história do Rock Progressivo.

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  5. Obrigado! Vamos ver se eles voltam pro Brasil logo também, que esse é um show que eu ainda não tenho no currículo! Se eles vierem, vou lá prestigiá-los, mesmo que eles estejam tocando as músicas antigas todas mais lentas...

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