sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Experimento Milgram: obediência ou perversidade?


Esses tempos, encontrei um texto delicioso na Internet -- na verdade, um trecho de um livro lançado nos EUA em 2007 chamado Elephants on Acid, que lista os mais bizarros experimentos científicos que já produzimos. No caso, as tais experiências foram levadas a cabo por cientistas sérios, com verbas governamentais e resultados verificáveis.Talvez alguns achem, à primeira vista, que o livro é uma chacota com a ciência, mas bem pelo contrário: o autor Alex Boese apenas brinca com a imagem do "cientista louco" para falar de ciência de verdade.

Neste site aqui, temos listados os 20 melhores casos dos quase 100 cotejados pelo autor. Vale a pena ler, é entretenimento e informação puros (como LSD injetado em elefantes, o médico que bebia vômito, experiências com cabeças de cachorro e de macacos, e tentativas de desestimular sexualmente os perus -- a ave, não aquele outro peru). Mas teve um que me assombrou e que eu achei genial, especialmente porque a conclusão da experiência é assustadoramente válida.

É o experimento da obediência, realizado em Yale, EUA, anos 1960, e coordenado por Stanley Milgram. O cientista afirmava aos participantes voluntários que a sua intenção era "determinar o efeito da punição no aprendizado". Para tanto, eles tinham que acionar um choque elétrico toda a vez que a "cobaia" (um outro voluntário que deveria decorar uma sequência de palavras) errasse o que estava no gabarito. Detalhe: a cada erro, o choque aumentava 15 volts.

O dado impactante da experiência é que, mesmo tendo a consciência que estavam infligindo dor crescente a alguém, os voluntários continuavam a desferir choques cada vez mais potentes, mesmo com os gritos de angústia da "cobaia". Para os que perguntavam se aquilo não era demais, a resposta era a mesma: “O experimento requer que você continue”. No fim das contas, nada menos que dois terços dos voluntários continuaram apertando o botão de choque até a voltagem máxima, 450 volts, e aparentemente matavam a "cobaia". A porcentagem era ainda maior se os gritos não pudessem ser ouvidos nem vistas as reações de quem estava sendo torturado: a totalidade dos voluntários chegavam a desferir o choque máximo.

Só que a experiência, na verdade, era outra: Stanley Milgram estava interessado em ver até que ponto as pessoas estariam dispostas a seguir uma autoridade de comando. A "cobaia" era um ator que fingia estar levando choques, mas que não estava de fato sofrendo. Os voluntários, obviamente, não sabiam disso. As conclusões foram ditas de maneira assombrosa pelo cientista, que afirmou:

“Eu diria, com base em milhares de pessoas que observei durante os experimentos e na minha própria intuição, que se um sistema de campos de extermínio como os da Alemanha nazista fosse implantando nos Estados Unidos, seria possível encontrar trabalhadores e encarregados pelo seu funcionamento em qualquer cidade de médio porte do país”.

O "Experimento Milgram" acabou revelando uma das nossas facetas mais negras enquanto espécie, aquela que nos faz sentir aliviados quando não nos consideramos responsáveis por nossos próprios atos perversos -- por mais que os tenhamos praticado de maneira consciente, e sabendo das suas consequências. Isso explica desde a fácil massa de manobra que podemos ser até nossas atitudes sociais mais triviais.

9 comentários:

  1. Novamente, artigo excelente Ulisses. Valeu muito pelo fechamento com:
    "uma das nossas facetas mais negras enquanto espécie, aquela que nos faz sentir aliviados quando não nos consideramos responsáveis por nossos próprios atos perversos -- por mais que os tenhamos praticado de maneira consciente, e sabendo das suas consequências."

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  2. Isto ajuda na tese de que o ser humano tem uma natureza sádica, mas que é controlada pelo convívio em sociedade.

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  3. O ser humano, que se considera no topo da cadeia alimentar, pensa ter pleno domínio entre as espécies, ou seja, todas as outras espécies estão aqui para nos servir. Isso implica em dizer que, se uma espécie extra-terrestre aportasse aqui na Terra, e fosse tecnologicamente mais desenvolvida, possa usar de seres humanos como alimento e não poderíamos reclamar. Moser

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  4. Roberto, eu penso diferente: que o convívio em sociedade mascara, não necessariamente controla, a nossa natureza sádica.

    Lembro de um filme de sci-fi bem ruinzinho, Supernova, cuja única parte legal era a informação de que os desenhos animados violentos tinham sido proibidos (como Tom e Jerry), e isso causou o colapso da estrutura social, já que as pessoas não tinham onde descarregar o seu sadismo.

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  5. I'm sorry. I was very drunk at the time...

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  6. Exatamente! O controle é feito utilizando essas "válvulas de escape", que acabam mascarando o sadismo. Os desenhos animados são um bom exemplo, assim como as video cassetadas ou as pegadinhas.

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  7. tom & jerry... quer exemplo maior de sadismo? o ratinho explodindo o gato a toda hora. também o papa-léguas...
    very, very drunk... like now, who knows...
    Moser

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  8. Essa história de servir de alimento me lembrou uma palestra que assisti quando ainda era bolsista de IC sobre a teoria de Gaya.
    Dentre um milhão de informações, uma que me chamou a atenção na teoria é que os seres humanos estariam na terra para servir de alimento para outros organismos menores!

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  9. Eu gosto mais da teoria do gene egoísta, onde todos os seres vivos são apenas máquinas de sobrevivência, que garantem proteção e permitem a replicação dos genes.

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