sábado, 21 de novembro de 2009

Feliz aniversário atrasado, República


No último dia 15, o sistema republicano no Brasil estava aniversariando. Lá se vão 120 anos desde quando o marechal Deodoro foi acordado por um grupo de militares revoltosos e, de pijama, assinou a proclmação da República -- ou pelo menos assim reza a lenda.

O interessante é que, no caso brasileiro, "república" não foi sinônimo de "democracia". Quando se fala que o nosso sistema democrático é jovem, não estamos brincando: liberdade política real tivemos poucas vezes na nossa história, e de maneira não contínua. A democracia a valer, aliás, também está de aniversário. Muito mais jovem, ela fez apenas 20 anos neste último 15 de novembro.

Mas chega de divagações. Que tal alguns dados concretos sobre a República no Brasil?

O número de presidentes: é uma polêmica. Afinal, teve presidente eleito que não assumiu, teve junta militar provisória e presidente da Câmara como presidente em exercício. Na conta oficial, são 35. Mas, contabilizando apenas os que receberam a faixa, são 32.

A melhor profissão para virar presidente: advogados do Brasil, candidatai-vos, já que 16 (ou seja, a metade) dos nossos presidentes se formaram em Direito (incluindo o Sarney). Era um ótimo negócio na República Velha (1889-1930), onde quase todos os 13 mandatários máximos eram magistrados. Mas também não é ruim ser militar (nove presidentes de farda, 10 se contarmos o Getúlio -- que também era advogado).

Outras profissões que geraram presidentes: alguns tiveram como profissão a metalurgia, a sociologia, a engenharia civil (Itamar Franco!). Alguns tinham uma segunda ocupação, como romancista (de novo o Sarney), historiador, estancieiro, professor (Jânio Quadros, que era considerado excelente em sala de aula), futebolista (Café Filho, goleiro do Alecrim! -- JK jogou como amador no Atlético Mineiro) ou jornalista (Collor, o que reclama da imprensa, fez até estágio no JB). Também era legal chefiar o Serviço Nacional de Informações, o serviço secreto brazuca, na época da Ditadura: dois chefes do SNI ganharam a presidência.

Origens étnicas dos presidentes: até que reflete a nossa mistura cultural. Já tivemos descendentes de imigrantes italianos e alemães. E tivemos um presidente mulato há 100 anos atrás, Nilo Peçanha, que escondia a sua origem afro até nas fotos oficiais. Aliás, Nilo também era pobre, sendo o primeiro presidente a ter ascendido da classe mais baixa para a mais alta, bem antes de Lula. JK, por outro lado, é o único presidente conhecido no mundo a ser de descendêmcia cigana.

A religião dos presidentes: a esmagadora maioria é católica de batismo, mas Ernesto Geisel era luterano. E FHC é ateu.

Maior tempo na Presidência: Getúlio é imbatível nessa. Foram 18 anos, 6 meses e 25 dias (se minhas contas estão certas). Sei lá, ele deve ser também o presidente que mais usou de diferentes maneiras para chegar ao poder: por voto indireto, por voto direto, por revolução e, mais incrível, dando um golpe de Estado em si mesmo.

Menor tempo na Presidência: Carlos Luz, que ficou no poder entre os dias 8 e 11 de novembro de 1955 (quatro dias, portanto), após o afastamento de Café Filho.

Quantos golpes aconteceram: os golpes de Estado bem-sucedidos foram cinco -- a própria Proclamação da República, a Revolução de 30, o golpe do Estado Novo em 1937, o golpe preventivo de 1955 e o golpe de 1964. Outros tantos foram fomentados mas não deram certo.

Quantos ditadores tivemos: excluindo-se as juntas militares, tivemos sete governos totalitários. Além dos cinco presidentes militares pós-64 e de Getúlio durante o Estado Novo, Floriano Peixoto é considerado por alguns especialistas como ditador. Se o contabilizarmos, a República teve 31 anos de "governo de exceção".

Quantos vices assumiram: em sete ocasiões, os vices foram empossados por conta de renúncias, falecimentos ou afastamento por doença. Em outras quatro vezes, a presidência foi ocupada pelo presidente da Câmara ou do STF.

Quantos presidentes foram eleitos democraticamente: contando que as eleições na República Velha não eram democráticas, tivemos apenas SETE mandatários escolhidos livremente pela população. Sete de 32! Os números ficam ainda mais impressionantes quando notados que apenas QUATRO chegaram ao fim do mandato, e que somente TRÊS eram civis (JK, FHC e Lula).

Então, somos uma república que, nos seus 120 anos de história, teve apenas três presidentes civis eleitos democraticamente que conseguiram terminar o mandato. Somos ou não somos uma democracia jovem demais?

11 comentários:

  1. Jk jogou no Atlético Mineiro e era descendente de ciganos!
    Caralho, como é bom ter amigos que são poços de cultura e escrevem belos textos. Valeu Uli!

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  2. Só um adendo.
    Nenhum presidente foi eleito democraticamente pois o voto é obrigatório, portanto não democrático!

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  3. Se bem que isso gera um outro problema: um país onde o voto é facultativo também não seria democrático, já que o governante eleito não representa a vontade da maioria de fato da população... E se a maior parte do povo não for votar, seria justufucável pensar que ele não quer nenhum tipo de governo?

    ... brincadeirinha retórica, hehehehe.

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  4. Ulisses, o polemista!

    Não, seria justificável pensar que a maior parte do povo se absteve porque não se importa com quem é o governante e confiou a decisão aos que se importam. :)

    (Só pra entrar na brincadeira.)

    Bom, há quem diga que no Brasil o voto já é facultativo (dado que existem as opções de voto nulo e branco), apenas o comparecimento às urnas é obrigatório. E mesmo assim: "Em primeiro lugar, o voto no Brasil, há muito tempo, é facultativo: de 47 para cá, tivemos 20 projetos de anistia; de 92 para cá, todas as eleições foram anistiadas. Nenhum de nós conhece alguém que tenha sido punido ou recebido pena por ter deixado de votar."

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  5. Sobre a origem de Juscelino. Curiosamente, ambos os sobrenomes indicam origem judia. Por parte de mãe, Kubitschek é uma grafia germanizada do tcheco Kubiček, que significa descendente de Jacó; por parte de pai (caixeiro-viajante que morreu quando tinha 2 anos), Oliveira.

    Por outro lado, as referências na internet (sim, eu sei...) que apontam JK como cigano dizem que houve dois presidentes ciganos na história do Brasil: JK e Washington Luís (mais no Google).

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  6. Hehehehe, desta vez não polemista, só brincalhão. ;)

    Mas, fora de brincadeira, sou a favor do voto facultativo, certamente ele é mais democrático -- mesmo sendo a abstenção no Brasil, como tu apontou, não punida na prática.

    Mas, mesmo sendo obrigados a votar, podemos dizer vivemos sim numa democracia: ainda que a nossa participação eleitoral seja compulsória, podemos votar em quem (e no quê) quisermos.

    Putz, essa do Washington Luís eu desconhecia! Vou tentar achar algo em algum dos meus alfarrábios quando eu puder. Quanto ao Jucelino, na página do homem na Wikipedia parece ter se debatido a respeito de sua origem.

    A tua observação sobre o sobrenome do pai dele é super correta, Hisham -- ainda que traçar as origens étnicas de sobrenomes de critãos-novos seja um pesadelo para os historiadores (não só judeus, mas também muçulmanos, que não necessariamente eram árabes, recebiam este tipo de sobrenome). Pode ser, então, que ele teve as duas origens: judeu e cigano! :D

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  7. Bom. Eu tenho esse sobrenome mas na verdade tenho origem em três raças: Italiano, Russo (agora confirmado!) e Ucraniano (?).

    Vejam só! O alemão não aparece ali! Pelo menos não por enquanto :s. Ainda existe dúvida no Ucraniano e falta eu saber a descendência de mais alguns bisavós...

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