Pessoal, vocês creem que nossa moeda debutou esta semana? Pois é, o Real fez 15 na quarta-feira. Para os que tem por volta dos 30 (como eu) devem lembrar bem da euforia da época. Eu tinha 15 anos e foi um evento ir até o banco para pegar as primeiras notas do novo dinheiro. Era muito legal ver as notas de R$ 1, 5, 10 e 50 (as de R$ 2 e 20 ainda não existiam, e a de R$ 100 sempre foi lendariamente rara), com os animais da fauna nacional.
Isso porque ninguém aguentava mais as constantes trocas de moeda (num espaço de dez anos, foi de Cruzeiro para Cruzado para Cruzado Novo para voltar ao Cruzeiro para Cruzeiro Real para, enfim, Real), as notas de valores estapafúrdios (quem lembra que existiam notas de dez mil cruzados?) e as homenagens a vultos públicos duvidosos.
A forma engenhosa que a moeda foi trocada é algo que eu acho brilhante até hoje. Como a pura e simples troca de denominação da moeda já não surtia efeito nenhum na hiperinflação (cara, que tempo diferente era aquele!), precisava-se de algo mais inteligente. Eram os tempos do governo Itamar Franco, vice de Collor que assumiu após o impeachment. Aliás, na minha opinião, Itamar foi um melhores e mais divertidos presidentes da nossa história: em apenas dois anos e meio de mandato, ele controlou a inflação, estabilizou a economia, realizou um plebiscito sobre o retorno da Monarquia, relançou o Fusca e agarrou modelos sem calcinha no Carnaval carioca.
O ano de 1994 foi de uma euforia que superou 2002, com a festejada eleição de Lula e o Pentacampeonato: ganhamos uma Copa desacreditada com uma seleção empolgante, o Real surgiu valendo o mesmo que o Dólar e, para completar a comoção nacional, foi quando morreu Ayrton Senna, o heroi nacional que faltava desde sabe-se lá quando. Parecia que, depois de uma década perdida, seríamos novamente o país do futuro.
Por enquanto, ainda vivemos na promessa.
quinta-feira, 2 de julho de 2009
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A parte que eu sempre achei mal-contada da biografia do Itamar foi: como ele foi ser vice do Collor?
ResponderExcluirEle era do PRN. O Collor convidou ele pra dar mais 'peso' à candidatura (representando um estado mais populoso, etc), já que era praticamente um partido de um homem só.
ResponderExcluirO Simon teria sido convidado antes, mas negou.
E a criação da moeda foi brilhante mesmo. Depois de 2042 planos fracassados, eles aprenderam a lição.
Hehehehehe, essa pergunta sobre o Itamar eu me fiz quando do impeatchment: como diabos esse cara é o vice? Aliás, a população nacional se perguntou isso...
ResponderExcluirLembrei também que o PT acreditou (e apostou alto) que o Plano Real não funcionaria e, hoje, eles ficam irritados com o uso político que o PSDB está fazendo do aniversário da nova moeda.
Estou esperando alguma contribuição do Roberto, que entende muito de economia e política, em especial da sua parte folclórica. :D
Uma curiosidade sobre Itamar Franco é com relação ao seu nome. Para quem não sabe, ele nasceu numa embarcação "Ita" em alto mar. E daí vem o pitoresco nome do sujeito...
ResponderExcluirNão conheço muito a biografia do Itamar. Sei que era filiado ao PMDB e fazia parte do cenário político na retomada da democracia nos anos 80. Depois acabou saindo do PMDB e foi parar no PRN a convite do Collor. Além da importância do seu estado de origem, ele representava uma oposição ao Sarney, que estava queimado com os planos econômicos fracassados.
Outros personagens importantes são o Fernando Henrique Cardoso, Minstro da Fazenda na época e lider da equipe, além de Pedro Malan, que segurou as pontas com o mercado internacional e depois ocupou o cargo do FHC, consolidando o Plano. Ah, tem também o Armínio Fraga que foi chamado depois do baque que o plano teve na crise da Rússia. Como ele era especulador do mercado, sabia como sair de crises econômicas e dar a volta por cima. E foi o que aconteceu! Além disso, o Lula e sua equipe tem créditos por manter o que estava dando certo e aproveitar bem a época de vacas gordas dos últimos anos. Pelo jeito, tudo isso está dando certo, já que os efeitos da crise internacional não foram sentidos com tanta força no nosso país.
Complementando, não dá pra apenas dar o crédito pras pessoas que executaram/mantiveram os planos econômicos aqui sem olhar para o panorama geopolítico.
ResponderExcluirNão é coincidência que um monte de países "periféricos" no cenário mundial caíram em ditaduras militares na mesma época (anos 60/70), entraram em hiperinflação na mesma época (anos 80), depois foram redemocratizados e alguns anos depois reencontraram a estabilidade econômica nos anos 90. Esse foi o padrão não só na América Latina, mas também no Leste Europeu (e provavelmente outros lugares que eu não estou ligado).
A gente olha pra coisas como o Golpe de 64 e o Plano Real como grandes eventos da História do Brasil, mas vendo o grande quadro das coisas eles são meras instâncias de movimentos políticos globais.
(Para ilustrar o post, a imagem da nota de 1 real, que está saindo de circulação e em breve será apenas uma lembrança!)
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirSeguindo a idéia do Hisham, relembrar é viver... então vamos relembrar os diversos planos econômicos que antecederam o Plano Real:
ResponderExcluirOs planos anteriores tinham como filosofia o controle da inflação através do congelamento de preços e salários (Plano Cruzado I) ou aumento de impostos e reajuste controlado pelo governo (Plano Cruzado II). Eles se mostraram inúteis, pois tentavam segurar algo que estava fora de controle.
Com os congelamentos, a produção começou a se inviabilizar, pois o valor de venda muitas vezes não superava o custo de produção. Além disso, o aumento do salário mínimo gerou um aumento de consumo de produtos que não conseguiam ser produzidos, além de criar mais despesas para as empresas e para a máquina pública.
A idéia de fazer reajustes sistemáticos acabou gerando um caos no mercado nacional. Acho que todo mundo lembra das interminaveis filas nos postos de gasolina porque depois da meia noite o preço ia subir 50%... Sem falar da supervalorização da nossa moeda frente ao dólar, facilitando a importação, mas detonando a exportação. Chegaram a decretar a moratória e queimar o filme do país no cenário econômico internacional.
Além desses, houve ainda o Plano Verão e Plano Collor. Estes foram extremamente impopulares, pois mexiam diretamente com o dinheiro do povo, intervindo na poupança, nos fundos de investimento na conta-corrente. A Zélia inclusive é odiada até hoje por ter feito o famigerado confisco das economias do povo. A idéia era tentar acabar com os overnight, onde o sujeito ganhavam muita grana literalmente da noite para o dia, graças à inflação que fazia os juros dos ativos explodirem. Mas por ser uma medida impopular e descapitalizar o mercado, não funcionou.
O Plano Real se baseou em uma visão totalmente diferente. Ao contrário dos anteriores, que tentaram abafar a inflação, a idéia era "esquecer" que ela existia. O negócio era deixar de lado a indexação da moeda anterior e utilizar outra unidade-base, chamara Unidade Real de Valor (URV). O abandono da moeda antiga e a indexação utilizando outra base foi implantada também na Argentina no famoso Plano Cavallo. Só que os hermanos resolveram utilizar o dólar como regulador. No fim, a idéia brasileira acabou se mostrando mais interessante.
Segundo relata Fernando Henrique Cardoso na sua biografia (muito recomendável para quem quiser entender melhor os bastidores da política brasileira desde a queda da ditadura), o sucesso do plano dependia de 2 questões: a confiança do povo e do mercado internacional. Depois da moratória e dos desastres políticos e econômicos dos últimos anos, o Brasil estava mal-falado lá fora. Para isso, o Pedro Malan foi chamado, tentando convencer os gringos que dessa vez iria dar certo e renegociar a dívida externa. Aqui dentro, foi utilizada muita publicidade para tentar convencer a população e obter seu apoio. Eu lembro que era o tempo todo na TV e no rádio alguém explicando o que signifacava URV e toda aquela história...O plano então foi concretizado com sucesso, mesmo tendo grandes desconfianças de boa parte dos políticos do país e tá aí completando 15 anos. Pensando bem, é incrível como uma nota impressa em 1994 ainda tem valor sem ser carimbada...
Bem, o Golpe de 64 e o Plano Real são grandes eventos da história do país e fazem parte de uma conjuntura global mais ampla. Uma coisa não anula outra, hehehehe!
ResponderExcluirAliás, um parênteses: uma das coisas mais difíceis no ensino de história para os professores é fazer esta ligação micro/macroestrutura. No entanto, é uma ligação necessária e que nos faz compreender melhor os processos históricos.
E o que eu acho exatamente genial no Plano Real é exatamente a URV (muito bem explicada pelo Roberto -- vai pro Retrospectiva!) e o uso maciço de propaganda informativa para, exatamente, conquistar a confiança da população frente à ideia.
ResponderExcluirDetesto fazer comentários em sequência, mas esqueci de perguntar para o Roberto: o Armínio Fraga era especulador, é? Não sabia!
ResponderExcluirEle é economista. Trabalhava com o George Soros e acho que andou trabalhando para alguns bancos também. Não sei se ele era da linha de frente da especulação, mas estava no meio dessa galera...
ResponderExcluirComplementando o que o Hisham e o Ulisses falaram, esses fatos históricos são causas e efeitos dos acontecimentos em escala global. Afinal, imaginem se as ditaduras que eram alinhadas aos EUA tivessem na verdade um tom soviético. Se Cuba já deu dor de cabeça para eles... os golpes militares na América Latina foram causas da polarização do mundo, mas geraram efeitos que repercutiram no fim do século.
Roberto, falando em política, tu poderia preparar um texto aqui para o blog sobre a atual situação do Senado Federal e do nosso amigo Sarney, não é?
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