terça-feira, 23 de junho de 2009

O cover e a nova erudição

Dentre os inúmeros questionamentos que me faço sobre os caminhos que a cultura vai tomar no futuro, fiquei imaginando quais novas obras estariam dividindo espaço com as execuções de peças ditas “eruditas” ou “clássicas” no que se refere à música ao vivo.

Essa reflexão está muito ligada ao fato de perceber-se que até mesmo gerações anteriores às nossas elegeram novos clássicos para admirar e eles nada têm a ver com compositores como Mozart e Bach, ou Verdi e Puccini.

Posso até estar errado, mas agora até a erudição é ROCK e os grandes mestres do passado (recente, diga-se de passagem) podem estar até vivos, mas são venerados em cultos legítimos à suas obras, através de bandas tributo.

Que me lembre, “The Beats” foi o primeiro exemplar desse movimento que tomei conhecimento, mas não faltam exemplos para embasar a minha tese de mesa de boteco. Ontem ainda vi um comercial anunciando um show “Bee Gees Tribute Band” aqui em Porto Alegre, que deve custar a mesma exorbitância que muitos artistas “originais”. Isso sem contar nomes consagrados como o “Australian Pink Floyd”, que monta enormes estruturas para criar a mais verossímil experiência sonora e visual criada por Waters, Gilmour e sua trupe. Não preciso ir muito longe! Este blog mesmo, se formou à cerca do grupo que constituía e convivia com a “Fink Ployd”, que tinha os mesmos objetivos!

Música clássica sempre mexeu comigo, ao ponto de me emocionar vendo uma execução ao vivo. E essa era a “fronteira final” a ser superada por uma experiência cover e que o “Dios Salve a La Reina” (fotocópia castelhana do Queen) conseguiu ultrapassar com louvor. Não só de mim eles arrancaram lágrimas, mas de muitos dos colegas que postam aqui nesse blog, podem confiar.

Não sei se estou louco, mas acho que essa tendência bastante recente pode nos dar um vislumbre de como os grandes “clássicos” do rock vão sobreviver ao tempo. Grandes e caros espetáculos, quase que literalmente ressuscitando não só a música desses mitos, mas sua imagem e a experiência de vê-los ao vivo.

Não se trata aqui de fazer um julgamento de valores entre a qualidade de um estilo musical ou de outro, mas de perceber que, dentro de uma sociedade onde a imagem é tão presente, o cover tem o lado visual e, até mesmo, teatral a seu favor. Tratam-se de espetáculos mais “multimídia”. Mais “a ver” com nosso tempo.

Ressalto que não estou sugerindo que ninguém pinte os cabelos de grisalho e prepare os bobs para o permanente quando decidirem fazer parte de uma orquestra, até pra que não se assuste o pessoal dos conservatórios ou os músicos mais tradicionais. Ambos terão espaço sempre, mas que o piano está fadado a compartilhar o “status” de erudição com a guitarra, podem contar que está.

20 comentários:

  1. Pois é, realmente o que você escreveu é verídico.
    No entanto, não chamou a atenção para a tragédia que permeia o exposto: a adversidade pela qual passam as bandas de música própria.
    O que acontece na escala, digamos, macro, com essas bandas tributo enormes, acontecem também no underground. Bandas de musica própria perdem espaço, bandas cover ganham dinheiro e reconhecimento. Isso é culpa de quem? Das pessoas que preferem imitar do que criar? Das pessoas que preferem ver o que já viram mil vezes do que ver algo novo? Ou das próprias bandas autorais, por sua falta de qualidade em meio a enorme quantidade? Nunca saberemos. Mas vale e reflexão.

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  2. Eu escrevi um comentário todo articulado, mas a rede deu pau e não salvou e estou com preguiça de repensar os meus argumentos.

    Então, simplificando: o que vai acontecer com o rock é o que acontece com a música erudita: hoje ninguém conhece (fora aficcionados, e olhe lá) quem são os compositores contemporâneos nossos de concertos e sinfonias. Pronto, é isso.

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  3. Bah, bom tema de se colocar na mesa, especialmente pra essa galera aqui. :)

    Eu concordo quanto à parte de que a execução da música de determinadas bandas vai se prolongar ao longo dos tempos de forma similar às peças eruditas.

    Mas não concordo totalmente quanto à parte visual. Embora eu possa até ter certa empatia pelos músicos que se realizam imitando seus ídolos nos trejeitos, inflexões de voz, etc., eu acho que há uma grande diferença entre a "reconstrução" que existe no caracterização de um Hamlet em uma montagem teatral e entre a pessoa se "fantasiar", por exemplo, de Brian May. Alguns espetáculos de rock, como os shows antigos do Genesis, têm o conceito de cenário, personagens caracterizados com figurino, etc. Recriar isso, como o grupo The Musical Box faz, é na prática, "encenar um musical". É mais próximo de uma peça de teatro do que um show. De certa forma poderia se dizer que o schtick todo do Kiss cai na mesma categoria. Alguns antigos fãs, eu incluído, em outros tempos discordariam, mas hoje o próprio Kiss promove essa ideia de que o Kiss na verdade é um "conceito de show" mais do que as pessoas específicas que estão ali tocando. A diferença entre o Genesis e o Kiss, nesse caso, é que enquanto o espetáculo do Genesis está apresentando um conceito do qual o show é o meio (o Genesis apresentando "The Lamb Lies on Broadway") no Kiss o conceito não transcende, é auto-referencial (o show do Kiss apresenta "o show do Kiss"; eles passam a noite tocando rock que diz "I wanna rock and roll all nite").

    (Continua porque o comentário ficou muito comprido de novo!)

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  4. Pensando um pouco assim de bate-pronto, acho que existem três grandes abordagens quanto à parte visual nos espetáculos de rock: a abordagem onde o visual é mera extensão da expressão dos intérpretes; a abordagem onde o visual é suporte efetivo para a música, que engloba também a anterior; e a abordagem teatral, onde a parte visual é parte estrutural do espetáculo, englobando as duas anteriores.

    Na primeira categoria, eu colocaria bandas como Beatles, Queen, Led Zeppelin, Oasis. A parte visual, nessas bandas, refere-se à identidade dos músicos, de uma forma muito pessoal (Freddie Mercury, Liam Gallagher, Jimmy Page) ou como banda (terninhos e atitude iê-iê-iê dos Beatles).

    Na segunda categoria, eu colocaria a maioria das tours do Pink Floyd, algumas tours do U2, Radiohead. São espetáculos visuais que trabalham em prol da música e amplificam a percepção que o (como diria o Ulisses) fruidor tem dela. Entretanto, o aspecto "secundário" do visual pode ser percebido na medida que o visual não afeta o setlist. Ou seja, sem o visual, as músicas e o jeito de tocá-las seria basicamente igual, salvo a expressividade individual da primeira categoria.

    Na terceira categoria, tours como as antigas do Genesis, a ZooTV do U2, The Wall do Pink Floyd. Um aspecto característico desse grupo é a existência de personagens que os músicos encarnam. O conjunto de músicas passa a ser afetado pela apresentação visual; música e imagem são pensados e realizados juntamente.

    Falei tudo isso pra dizer que, pessoalmente, eu vejo sentido artístico em "encenar", com reconstrução visual, espetáculos da terceira categoria. Pra mim faz sentido fazer o papel de Pink ou o do Médico do The Wall, mas não vejo sentido em "se vestir de Freddie Mercury", ou imitar os trejeitos do Jimmy Page de tocar guitarra.

    No caso da Fink Ployd, o que fizemos foi um show que eu colocaria na segunda categoria, que é pessoalmente o tipo de espetáculo que mais me interessa fazer, artisticamente falando. Musicalmente, a motivação era, como tu bem colocou, a de honrar uma peça que a gente considera tão altamente como qualquer obra erudita (nesse sentido toda orquestra é uma "banda cover"). Visualmente, nós quisemos complementar a música em função de quão bem a música do PF se presta a isso, como bem demonstrado pela própria banda na tour do Pulse -- mas fizemos isso desenvolvendo o nosso próprio suporte visual. Com referências e citações ao material visual usado pelo PF, claro, mas em nenhum momento tentando recriar um espetáculo deles -- colocamos muita coisa visual ali que nem sequer remetia a um show do Pink Floyd; era a nossa própria interpretação visual das músicas.

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  5. Ontem ainda conversávamos sobre isso, Hisham, Roberto, Jean e eu. E concordamos que, sim, é divertido e até bonito de ver uns caras que nem os do God Save the Queen se realizando ao encarnar seus ídolos (mais notadamente o "Brian May" e o "Freddie Mercury" - este, assustadoramente parecido com o falecido vocalista do Queen).

    Mas eu concordo com o Hisham quanto à questão das três categorias. Assisti a dois shows do God Save the Queen. Em ambos, como o André apontou, me emocionei - e muito - como fã que sou da banda original, e pela incrível semelhança de timbres e cuidado com os detalhes nas execuções das músicas. E, sim, me impressiona o visual desse dois sujeitos que apontei antes. Mas - sugestão inteligente do Roberto - acompanhei os dois concertos em locais longe do palco, o que reforçava a impressão visual de que eu estava vendo um show do Queen (ouseja, eu não estava perto o suficiente da banda para "ver" que eles não eram os verdadeiros... enxergar os "defeitos visuais"). Mas o mais importante é que o Queen é o Queen principalmente pela força das canções (vamos ilustrar mais uma vez: essa banda holandesa também faz um tributo ao Queen, não se preocupa com o visual, mas impressiona igualmente).

    Continua...

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  6. Acabei de ver a propaganda do "Australian Bee Gees" na TV. O que há com esse povo da Austrália e da Argentina?...

    Continuando. Sobre o segundo grupo mencionado pelo Hisham: Pink Floyd, U2 e Radiohead são bandas que, cada uma em sua década (a grosso modo: 70/80, 90 e 00, nessa ordem) foram (e, no caso do Radiohead, são ainda) referências no conceito de espetáculo audiovisual, onde a música funciona em conjunto com as imagens, na tarefa de despertar sensações nos espectadores. Essa é uma experiência que eu enxergo como algo mais ligado à sensação de imersão, no sentido de viajar mesmo com o espetáculo, se deixar levar pelas sensações causadas pelas luzes, pelas, projeções, pelos vídeos e, lógico, pela música.

    (PARÊNTESE ABSURDO: tô vendo um DVD do Enio Morricone regendo uma orquestra que interpreta as trilhas sonoras mais famosas dele. Tô arrepiado ouvindo a execução dos temas de "Três homens em conflito", é impressionante).

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  7. Continuando de novo. Pra mim, a grande diferença entre a segunda e a terceira categoria levantadas pelo nobre colega é que, na primeira, temos bandas com "ícones humanos" e, por isso, talvez seja mais complicado de aceitar alguém muito parecido fisicamente que vai lá e repete trejeitos e maneirismos do ídolo em questão. Já na segunda categoria, temos bandas com "ícones sensoriais", ou seja, seus próprios espetáculos. A criação, enfim, supera o artista em si, vide shows antológicos como a turnê Zoo TV, do U2, Pulse, do Pink Floyd, e a atual turnê do In Rainbows, do Radiohead.

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  8. Mas qual é a arte em se vestir igual a alguém e imitar o seu jeito de ser?

    Por mais que eu até compreenda a graça que a pessoa que o faz sente, eu não consigo deixar de achar que o que um fã como o Chico faz ao ir ver um show do God Save The Queen é um exercício de self-deception.

    E eu acho difícil comparar, ou mesmo classificar nos mesmos termos (ícones humanos vs. sensoriais) a construção de uma persona pública e a construção de um espetáculo artístico.

    Uma persona pública é algo muito individual. Não concordo que seja uma "construção artística" e portanto reproduzível. Pra mim seria o mesmo que alguém aparecer no meio político vestido de Mário Covas, imitando o jeito de falar e os gestos do Mário Covas, se apresentando como "cover" do Mário Covas e dizendo que vai seguir a mesma plataforma política dele, e pedindo votos.

    Agora, uma interpretação de uma música de outro compositor é algo totalmente diferente. A interpretação musical é uma performance art, como a atuação. A composição musical é como a escrita. Interpretar a música de outros permite colocar a sua arte como intérprete, mesmo quando é usado o arranjo original. Imitar a interpretação de outros pode até ser um bom exercício de atuação (tal como Val Kilmer no filme The Doors?) mas não pode ser entendido como um show nos termos que entendemos um show musical, onde vemos músicos dando a sua interpretação das músicas. É uma simulação da interpretação de músicos que não estão realmente ali.

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  9. (Ah, só pra esclarecer: obviamente eu não acho necessariamente que construções artísticas sejam reproduzíveis.)

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  10. Eia!

    Gostaria da opinião de outras pessoas quanto ao que eu escrevi, porque acho que tu não me entendeu, Hisham.

    Cara, na boa, não vejo como um exercício de self-deception ir assistir a uma banda como essa. Não vou consegui explicar direito o que eu senti lá, não vou mesmo. Mas eu acho que tu tá racionalizando demais uma experiência que é feita pura e simplesmente para divertir e emocionar as pessoas - e foi exatamente o que eles conseguiram não só de mim, mas de muitas outras pessoas. Pode parecer meio simplista - e provavelmente é -, mas é isso. Se eu fosse ver eles com uma postura cética, procurando os defeitos e lembrando a mim mesmo o tempo todo que o que eu estou vendo é uma imitação, mesmo que ela beire a perfeição, realmente eu não curtiria lhufas. Eu fui lá pra ver uma banda "kicking asses" ao vivo, e foi o que eu vi, pela segunda vez.

    De maneira alguma coloquei a construção ou reprodução de uma persona pública como algo artístico - realmente não é. Porém, vamos combinar, comparar a construção de uma persona pública política com uma persona de um artista não parece ser a melhor maneira de ver a coisa - por razões óbvias, acredito.

    E tu realmente não acha que imitar a interpretação de outros não pode ser entendido como um show? Pôxa, pra mim, é um baita entretenimento... posso até concordar contigo que a parte de imitar os trejeitos tira a força artística do negócio - no meu ver, as canções, a obra musical - mas não deixa de fornecer um belo entretenimento, uma diversão. Cara, é show, sim!

    Ah, as opiniões divergentes... por isso que eu gosto desse blog! Hehehe!

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  11. Falei pro Hisham ontem: este papo tá ficando hermético, hehehe!

    Comentário consistente de Ulisses Costa em algum momento desta quinta-feira.

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  12. A comparação de um artista com um político não é uma boa comparação, já que as duas imagens tem representações totalmente adversas dentre da sociedade. Mas acredito que o Hisham chutou um exemplo aleatório (estaria ouvindo Rogério Skylab para se remeter ao saudoso Mario Covas???), e isso não invalida a tese a priori.

    De qualquer forma, um artista sempre representa no palco. Até mesmo o Eric Clapton sem expressão é uma representação... duvido que o Freddie Mercury passava o dia inteiro durante a vida inteira sendo aquela figura pitoresca dos palcos. Tanto que o nome dele era Farokh Bulsara. Assim, o sujeito que se presta a imitar o Freddie Mercury, está imitando o personagem e não a pessoa. O que seria diferente de querer se passar por Mário Covas, tendo como princípio a idéia de que o político e o ser humano se confundem na mesma pessoa.

    Mas de qualquer forma, não vejo nenhum demérito em imitar. Se olharmos com olhos reducionistas, todas as artes são diferentes formas de imitar a vida real.

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  13. O político e o ser humano são a mesma pessoa, assim como o músico e o ser humano são a mesma pessoa, salvo em espetáculos da "terceira categoria" da pequena taxonomia que eu defini onde o espetáculo é efetivamente teatro e o "ser humano" em questão é explicitamente um personagem. (Em uma montagem qualquer de The Wall, o ator representa o personagem Pink, e não o Roger Waters. Mas no show do Pulse, o David Gilmour é o David Gilmour, e se alguem quiser tocar as músicas do Pulse, não enxergo razão artística válida para "representar o David Gilmour".)

    O exemplo do político pode ser esdrúxulo, mas na vida real vemos políticos que constroem suas carreiras baseados na imagem de outros -- não preciso citar exemplos, mas relações de parentesco frequentemente são exploradas assim. Uma persona pública que é elevada a status de "ícone humano" não se torna um personagem reproduzível: ao tentar reproduzi-lo a reprodução é uma coisa outra que não o original. Assim como o imitador do político não é um político, o imitador do intérprete não é um intérprete. Ele é um meta-intérprete. Pode ser um ator representando um vocalista de uma banda de rock, mas ele não é um vocalista de uma banda de rock.

    E discordo que um artista sempre representa no palco. Quem representa é ator. Eu não represento no palco. Tenho uma determinada atitude que eu considero condizente com o contexto. Eu ajo de um jeito específico no palco, assim como ajo de outro jeito específico no trabalho, outro jeito numa sala de aula, e outro jeito num velório. Se a atitude no palco é representação, então todas as outras também são.

    O Freddie Mercury sabidamente tinha uma atitude bastante flamboyant na vida -- em determinadas situações menos, e em outras bem mais pitorescas do que o jeito de ser dele no palco. Mas essas coisas, palco e não-palco, faziam dele a pessoa que ele era, constituíam a individualidade dele. Sobre o nome de origem, até onde eu sei ele tinha abandonado essa identidade fora dos palcos também. Freddie Mercury era uma pessoa, e não um personagem de Farokh Bulsara. (A não ser que se esteja considerando "personagem" em termos tais onde o Hisham seja um personagem do Hisham.)

    Sob nenhum olhar pode-se dizer que todas as artes são diferentes formas de imitar a vida real: isso considera meramente arte representacional e exclui a arte abstrata. E música é, fundamentalmente, arte abstrata.

    Resumindo a minha tese: tocar uma música do Queen e imitar o Queen tocando uma música do Queen são coisas fundamentalmente diferentes. Chamar as duas coisas pelo mesmo nome, "banda cover", é promover uma confusão semântica tremenda, que infelizmente está estabelecida por aí.

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  14. Olha, eu demorei para escrever porque queria ter certeza da minha impressão inicial do assunto. Por isso reli detidamente, várias vezes como eu nunca li nada em nenhum blog, para ter certeza da minha concepção.

    E, de fato, acredito que vocês estão falando um monte de bobagem. Da grossa.

    (calma, o início arrasador foi só para deixar todo mundo atento)

    O principal problema da análise do Hisham é que ele diferencia "show de música e "peça de teatro" como se fossem baseados em conceitos diferentes. Não são.

    As três categorias propostas por ele indicam, sempre, a presença de uma mise-en-scène, de uma encenação em algum tipo. Uma banda punk possui um certo tipo de encenação na sua atitude, na sua postura, no fato de tocar mal e em palcos pequenos. Como disse sabiamente o Roberto sobre o Clapton, a expressão dele é uma encenação.

    Acho que o que faltou em todos os comentários uma comreensão maior do que é atuação e o que é encenação: não são necessariamente coisas iguais. Alguém encenar não quer dizer que está atuando, ou vice-e-versa. Sem contar que, certamente, se um psicólogo passar por aqui, vai falar dos diferentes papéis que assumimos no nosso cotidiano, etc.

    Desculpe-me discordar, Hisham, mas quando tu sobe no palco tu está obviamente se comportando de outra maneira que não é a que tu te comporta quando está trabalhando, por exemplo. Em cada momento específico da nossa vida, nós deixamos aflorar um lado específico da nossa persona. A diferença entre nós e os atores é que estes têm conhecimento de técnicas de como explorar estas diferentes lados de sua personalidade em prol de uma peça de teatro ou de um filme (como é um processo racional, chamamos de atuar).

    A ideia de que tu não encena ao estar produzindo música deve ser relacionada com o fato de que é esta a atividade que te faz sentir completo enqaunto ser, por estar se expressando artisticamente. Mas é, sim, uma encenação, uma visão de um Hisham diferente do cotidiano. Como tu não começa a filosofar durante o show, por exemplo, já é mostra o suficiente que não é o mesmo em todas as situações. Psicologia explica.

    O que eu estou querendo dizer é que toda e qualquer coisa que se ponha num palco obedece a uma mise-en-scène e, portanto, é uma atuação. Pode-se dizer que a música é o elemento mais importante -- o que de fato é nos espetáculos músicais -- mas de forma alguma será o único elemento, a ponto de um show não poder ser relacionado conceitualmente com outros tipos de espetáculo. E esse é o erro básico, na minha opinião, da discussão toda.

    E, convenhamos, debater semântica de banda cover é exagerar no apreço metafísico da questão...

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  15. Cara, como é que tu acha que eu não vou me debruçar sobre a questão do significado de algo que eu dediquei incontáveis horas da minha vida? E não estou me referindo só a essa discussão. Já pensei muito sobre esse assunto, e essa discussão aqui está sendo uma forma incrível de ordenar os pensamentos e colocar eles no concreto.

    Resumidamente, eu discordo com boa parte do que tu escreveu, Ulisses, e já pensei o porquê disso, mas como eu estou de saída agora eu apareço mais tarde para refutar os pontos. :)

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  16. Mas eu tenho certeza que vamos discordar até o final do debate. :D

    Agora eu reli o que eu mesmo escrevi, eu acho que incorri num erro na minha argumentação. Parece que eu estou querendo fazer uma análise da tua personalidade, o que não é o caso. Caso queira relevar comentários sobre "Hisham tocando", esteja à vontade, porque é o que eu farei na sequência. ;)

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  17. Concordo com o Ulisses. Hisham, quem te conhece batendo papo, vê claramente que, por exemplo, ao tocar "run like hell" no bar do morro, estavas sim interpretando um personagem que gostarias de estereotipar. No caso da F.Ployd, concordo com Hisham quando diz que, apesar de tocarem músicas cover, e agregarmos ingredientes extra-musicais como faziam os originais, foi procurado uma identidade própria na forma de "tributo", tanto que já assisti várias bandas covers que tentam sim, no palco, imitar os integrantes, o que não ocorria com a FP, não por incapacidade, mas sou testemunha que essa postura nunca foi objetivo do projeto. Por isso que citei a performance do Hisham, e lembro também do Coutinho batucando nos seus bongôs mágicos. Bem, não sei se contribuí, mas teria mais a falar que não sei como traduzir em palavras escritas. Valeu.
    Moser

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  18. Momento "criança feliz": meu post é um dos mais polêmicos do blog! Que maravilha! Lenha na fogueira, meu esporte preferido... huahauahauh!

    Assim que der eu compro a briga, ok? O tempo tá curto... ;)

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  19. Criança feliz, né? Vai lá responder a chulapada que eu te dei no post de cinema e literatura pra ver o que é polêmica, heheheheheh! :D

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  20. Eu li toda essa discussão, e acho que entendi algumas coisas. E outras não. Mas vai a minha opinião:

    1. Acho estranho bandas imitarem os originais, mas não tenho nada contra, acho até divertido.
    2. Acho legal projetos que tentam recriar o show, ou o espetáculo (eu ia achar massa um The Wall cover no teatro Por do Sol, por exemplo).

    Agora, não faço distinção de arte, acho que os dois o são. Fazendo um paralelo, como posso dizer que o Chico não é artista imitando o Senor Abravanel? Ou o Gustavo imitando a gurizada? Ou o Damasceno imitando o Paulo Santana?
    A arte do cara é justamente imitar! E nesse saco por exemplo eu coloco o Brian May fake e os 200 milhões de Raul Seixas cover que temos pelo Brasil.

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